É preciso uma estrangeira pra
falar de moda.
Cris e sua mala de estrangeira. Fonte.:www.hojevouassim.com.br
Cris Guerra é publicitária, não é
estilista, não é bem uma jornalista de moda oficial, não é produtora de moda,
nem fotógrafa de moda, maquiadora e outras profissões da moda. Às vezes, quase
sempre ela consegue ser tudo isso, e ainda, para além disso. É comum ler que
Cris, do blog Hoje vou assim ama
moda, tem o primeiro blog de looks diários do Brasil, se veste muito bem e isso
não é novidade para ninguém que acompanha notícias de moda. O que poucos sabem,
ou melhor, dão pouca importância, e chama pouco a atenção é que talvez, aqui no
Brasil, a Cris seja uma das poucas pessoas que levantam embates pertinentes
acerca das potências da moda. E diz isso pra muita gente. Isso não significa
que ela seja uma acadêmica e que faça isso citando um amontoado de referências
bibliográficas. Nada disso, Cris usa a moda como motor de comunicação,
comportamento e linguagem. Alguns ditos acadêmicos por aí vão dizer que eu
estou louca, afinal tudo que faz sucesso e alcança a massa parece ser renegado
ao menor, ao mais frágil e ao superficial. Pois bem, eu acredito que é nos
discursos das superfícies, do efêmero é que se cria e se sustenta a época
contemporânea. Nos dias de hoje, muitos de nós carregamos discursos que
apresentam por características a superficialidade, o visível. Fazemos isso até
mesmo sem ver, pois vivemos numa época de imagens, muitas (inúteis) por sinal.
Por isso voltando a Cris, suas impressões a partir da moda, correspondem
associações pessoais, ainda que dotadas de referenciais internos, externos e
materiais que compõem nossa subjetividade, aquilo que pensamos ser puro, mas
que de fato, é bastante diverso e mutável.
Pois bem, a começar pelo uso da
moda, como linha de fuga para a sobrevivência emocional. Cris tem em parte de
sua história uma perda, que parece ter mudado sua vida por completo. Para quem
a lê, nas palavras bordadas por roupas e nas letras que Cris também
disponibiliza ao leitor, ela relaciona a moda ao seu corpo que pulsa emoções,
intenções e faz desse conjunto um potente campo de afecção que envolve a si
mesma e aos outros. Percebe que coisa mais bonita? Como na moda, sem ser pesado
de mais, ao contrário, a partir da leveza, é possível fazer poesia que
enriquece o olhar, inspira e colore o dia? Poesia pura, eu repito. E Cris,
nessa honestidade despretensiosa e cheia de intenção conseguiu falar e escrever
palavras impressas em roupas, compostas em looks como forma de convite para uma
conversa, um cumprimento e até mesmo uma questão e sem precisar ir longe demais
colocar frutas na cabeça ou coisas do tipo. A força da Cris está na afirmação
de um poder da moda a partir do gesto trivial e da ação cotidiana do vestir. O universo dela ao encontro do universo da indumentária.
Lipovetsky, importante filósofo da moda e da “hiper-modernidade”, já dizia que a
moda liga-se ao prazer de ver e de ser visto. De fato, ser visto é poder
manifestar e ver é uma forma de agregar repertório e conhecimento. Em relação
ao prazer, não é somente o deleite ingênuo, mas prazer está relacionado a
muitas formas de pensamento e criação. Sinto prazer, por exemplo, no que me
acrescenta, no que me preenche de beleza, isso tendo em vista meu conceito de
beleza e que está prestes a mudar na próxima esquina. Efim, tudo isso para
dizer que acho lamentável a deturpação do sentido da moda, quando aprisionada a
elaborações endurecidas do gosto, gosto comprado por um sistema que busca
padronizar e vender modos de vida, que são revendidos pelos “naturais” da moda.
Assim sendo, desejo que tenham mais estrangeiros, ainda que disfarçados para
falar sobre moda, com palavras, tecidos, linhas, bordados, gestos e ações.
Para conhecer mais da Cris, ela tem outros blogs Cartas para Francisco e Amor e ponto.